segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Fogos de artifício


Por Tamires Santana

A água é indispensável,
E é constantemente ferida pelas criaturas
O ar é influenciado
Seja desde um peido a incansável lareira
A terra é firme
Só que muito sensível às construções
Já o fogo
É simplesmente implacável.

Uns tais de Fogos de Artifício da China chegaram
Em uma data comemorativa se apresentaram.
Saiu de uma cavidade pequena,
Enfrentaram a gravidade,
Estouraram fazendo estardalhaço
E do alto, luzes brilhantes soltaram.

Esses asiáticos...
O fogo lá de baixo só olhou
Até concordou que, se em conjunto, os tais dos fogos de artifício ficam mais encantadores
Mas não ao ponto de o compará-lo.

Passou em alguns lugares,
Consumiu tudo por onde o vento o soprou
E, com isto, seu domínio mostrou.

Apesar dos fogos de artifício queimarem
Servem apenas para comemorar
Enquanto o fogo
Fulminante
Determinado
Voraz
Quarto elemento básico da existência
Não permite se igualar.

Quatro crianças e cinco olhares


Por Tamires Santana


Eram quatro crianças pobres
Três meninos e uma menina
O mais velho assumia o papel de pai e mãe
Pegando na mão
Dando carinho
Prestando atenção.

Um homem entra
Escolhe um assento
Tenta fechar o guarda-chuva
Seguido por cinco olhares curiosos
Não se constrange, é indiferente.
Consegue o feito
Duas estações adiante e desembarca.

Eram oito Havaianas sujas de barro
Pelo menos dois furos em cada roupa de cores desbotada
Peles da noite
Olhares desconfiados
Observadores dos mínimos detalhes
Num rosto sério de quem quer impor respeito.
O acalanto do trem nina os menores
Balança tanto que derruba um par de chinelos.

Criança pobre tem dignidade
Tem inteligência
Capacidade
Integridade
Merece mais consideração
A começar da própria sociedade.

domingo, 30 de dezembro de 2012

A negrinha do sapato vermelho




Por Tamires Santana

Existia no Império de Xingu, na Dinastia de Yapoke (1120 a.c – 1000 a.c) uma mulher fanática por sapatos vermelhos. Tinha muitos, de todas as tonalidades existentes no extenso Império, sem contar tantos outros trazidos por nômades vindos de lugares longínquos. Ficou conhecida como a Negrinha do Sapato Vermelho.

Certa vez, se apaixonou por um homem belo e generoso, dono de muitos livros e de família honrada. Mas o amor, como se deve esperar, não é tão simples de explicar e vivenciar. Este homem era mais velho, o que, para a época, não era favorável para o laço matrimonial.

Acreditava-se que um homem e uma mulher, ao unir-se, por amor ou arranjo da família, deveriam ter no máximo quatro luas de diferença um do outro e, prioritariamente, o homem deve ser o mais velho para acompanhar a mente avançada da mulher. A tradição também dizia que o casal deve envelhecer junto.

O homem era bom, talentoso e dono de uma habilidosa oratória, fator reconhecido pela cultura do Império naquela época, porém, tinha uma marca triste em sua vida: uma desilusão amorosa. Há dois anos o homem havia entregue seu coração a uma forasteira vinda de Palpam. Os dois planejaram o casamento, até que certo dia a mulher fugiu com o Príncipe Temor, não sendo encontrada. O homem, desde então, nunca mais foi o mesmo.

Negrinha do Sapato Vermelho, mesmo tendo conhecimento desta triste história, não desistiu e prosseguiu na tentativa em conquistar o amor de sua vida. Costumava ir, todos os dias, pedir orientação a deusa Afrodite, debaixo de uma Reza Missa, ao por do sol. Numa dessas ocasiões, se deparou com um sábio. Resolveu pedir conselhos ao velho desejando orientação em como conquistar o amor do homem.

Calmamente, o griot, após tomar conhecimento do caso, conclui: não deve-se jogar pérolas aos porcos. Desapontada com a recomendação, Negrinha do Sapato Vermelho fixou a ideia de que poderia mudar o destino, mesmo após a vidência de um sábio.

Desejou do fundo do seu coração o amor daquele homem enquanto calçava um par de sapato vermelho cor de sangue. Atingido pela cor o homem ao vê-la lembrou-se de sangue, sangue lembrou de coração, de coração lembrou de amor e olhou nos olhos da jovem. Percebeu que anos havia se passado e ele vivia amargurado. E assim, apaixonou-se apenas pela metade da Negrinha do Sapato Vermelho. 

Convicta de que havia conquistado o amor quem mais desejava, Negrinha do Sapato Vermelho parou de comprar sapatos vermelhos. Sua vida voltava-se totalmente para quem tanto amava e com  tamanha ocupação palavras, pensamentos e ações eram apenas sobre e para ele. Deixou até de comprar sapatos vermelhos e com isto, ia deixando de ser ela mesma.

Ano se passaram, o homem envelhecia mais e mais. E a paixão por ele não cessava. Até que, a mulher do passado aparece no presente. Tudo se abala e fica inseguro. A forasteira exige o coração do homem de volta e agora pede pra que ele vá com ela. Eis que o homem se decide e vai viver o seu grande amor, deixando Negrinha dos Sapatos Vermelhos. O conselho do sábio finalmente se concretiza. A Negrinha do Sapato Vermelho não tem mais vida. De vermelho passou a viver o resto dos seus dias cinza.

Altar e perdição


Por Tamires Santana

O olhar imóvel de um rosto angelical, copiado fielmente de uma meretriz da Era dos Grandes Pintores, hoje é confiada ser uma verdadeira santa; o acabamento é revestido por madeira e qualquer coisa dourada; pinturas antigas forram o teto. Tudo muito bonito de se ver, parte do cenário do qual o padre, pecador, prega a palavra de Deus diante de seu rebanho. São ovelhas da Era Funk que dissimulam rezar e cantar os cânticos com sentimento, mas não veem a hora de sair para almoçar.

Parece que a palavra não surte mais efeito como antigamente. Não se fazem mais religiosos como antes. O que será que aconteceu? Fazê-los acreditar nas escrituras de um livro organizado sob os interesses do Vaticano é o desafio de qualquer escolhido pelo Senhor. O reino dos céus será dos alucinados.

Está tudo perdido, me parece. O terço de madeira desejava vir ao mundo como enfeite de estante. Sofre cada vez que a mãe o aperta firmemente ao se desesperar pelo filho que se perdeu nas ofertas fáceis dos tempos modernos. Não adianta mais sentar no próprio rabo e olhar apenas para o nariz, se uma mãe chora, todos sentem a dor.


Os traços lembram uma santa, os braços abertos sugerem acolhimento, aos pés do vestido longo e azul, conchas do mar e areia; a base é de madeira revestida pela pele de algum animal; velas, flores, ervas, pembas, espadas e pedras. Tudo muito estranho de se ver, parte do cenário do qual o pai de santo, pecador, incorpora e repassa a palavra de uma entidade diante de um irmão. São pessoas da Era Crise que lamentam não sabem lidar com seus problemas pessoais, esperam um descarrego e não veem a hora de sair para jantar.

Parece que ir uma vez por semana tomar passe não resolve mais como nos tempos antigos. O branco não é mais a cor da moda? Fazê-los acreditar nas palavras de um morto que afirma que se deve aprender a lidar com os próprios sentimentos e parar de culpar o outro é a provação para qualquer sacerdote. O reino dos céus será dos loucos.

Está tudo perdido, me parece. A roupa branca desejava ter sido confeccionada de outra cor. Não aguenta mais ser absurdamente clara apenas uma vez por semana e ser usada como mero adorno. Do que adianta vestir o externo enquanto o interno não muda nunca? A hipocrisia é um mal da modernidade.


O altar é de madeira maciça; os instrumentos da melhor banda de todos os tempos; o piso recém- reformado; as cadeiras novas. Tudo muito bonito de se ver, parte do cenário do qual o pastor, pecador, prega a palavra do senhor diante dos irmãos. São ovelhas da Era Lucro que camuflam nos hinos os olhares atentos e não veem a hora de sair para comentar alguma coisa sobre o outro.

Parece que vestir a roupa nova e justa e estar presente no culto dominical não apresenta resultado algum. Não era para oferecer o melhor pra Deus?  Fazê-los acreditar que a transformação está dentro de cada um e não depende do pastor nem sempre é o que o bispo da TV ambiciona sintonizar em massa. O reino dos céus será dos questionadores.

Está tudo perdido, me parece. Pregar a palavra não basta, tem que ficar gritando, bitolando e domesticando as ovelhas.  Ainda assim, o Senhor, tanto evocado nestas ocasiões, não vê a hora desse povo todo começar a entender o verdadeiro sentido de suas palavras e parar de fantasiar sobre a sua volta. Do que adianta voltar se o que já foi transmitido ainda não é compreendido?

A ignorância e a ganância parece que grudaram nos corações e mentes dos homens. Está mais fácil tirar goma de mascar do cabelo.

Eduardo, o chato




Por Tamires Santana

Eduardo até me pareceu um cara valente, morador do senso comum e pregador de ideologias básicas. 

Me enganei!

Eduardo é um chato e isto é quase tudo. Nas infinitas e excessivas discussões sobre a situação do brasileiro, a tragédia futebolística, o índice de violência e a dança da prostituição com garotas de menores e estrangeiros tarados, ele diz a verdade. O problema é que acentua tanto a temática que acaba rondando sobre os mesmos argumentos.

Eu já entendi sobre o drama, as lágrimas derramadas ao som do calibre n° X, as gerações que se perderam influenciadas sob a ótica de mensagens ilusórias do canal Y. Eu só não entendi quando o Eduardo vai parar de falar.

Talvez a culpa seja minha, sabe?! Tenho a mania de querer entender os problemas e a partir deles tentar resolvê-los, todos, se possível. Enchessão de saco deve ser o mais breve possível. Não admito lamentações, choramingo e lamúrias; sou implacável quanto ao posicionamento de “nós somos pobres coitados, manipuláveis” e extremamente rebelde quando diante da prolixidade.

Só falta o Eduardo fazer um convênio do PAF* e aguardar a morte, tamanho o pessimismo que o ronda. Mas antes de morrer, é claro, ele precisa de três coisas: fazer um filho, escrever um livro e plantar uma árvore. Pelo título do livro Eduardo: a guerra não declarada na visão de um favelado e posteriormente pelas informações que se encontram no prólogo, talvez ainda falte plantar uma árvore.


*Nada contra os segurados do plano. Até acho uma boa pensar nos trâmites do enterro e poupar quem fica de todo o desgaste. Apenas usei do argumento para ilustrar o conceito.