Por Tamires Santana
Certa vez, a Luz, a mais irradiante de todas da
criação divina, resolve presentear o Homem, ser recém-criado por Deus, curioso
e que ainda descobria o mundo. Luz gostava do jeito ainda ingênuo do Homem e de
como era atencioso com a Natureza; Decide então, demonstrar o seu pequeno
carinho e, em uma leve caixinha, embrulhada com penas de pavão e amarrada com cipó
de ouro, havia dentro o prazer mais puro que já
existiu até então: o ato de dormir.
Deus, vendo todo o carinho que Luz sentia, se comove
e, sabiamente, sem que o presenteador e o presenteado soubessem, coloca dentro
da caixinha um pequeníssimo embrulho, enrolado com mistério e que abrigava o
despertar. Ao ser presenteado, o Homem irradia felicidade por todos os lados,
pois está maravilhado e muito agradecido.
As Trevas, imersa na escuridão, atingida pela
irradiação da felicidade do Homem e ínvida que só, não gosta nem um pouco de
ser incomodada, ainda mais por quem ainda nem ao menos sabia direito pra que
veio ao mundo. Ao tomar ciência do sucedido, fica arretado e arruma argumentos
o suficiente que inspiram uma tal de vingança, sabe lá do quê e porque.
Como não podia expor toda maldade que o acompanha,
precisava ser sutil para não chamar a atenção. Sendo assim, sentou-se embaixo
de uma figueira e, após séculos arquitetando, risca com um graveto todo o plano
maquiavélico na terra e percebe que precisaria de ajuda.
Caminha sete anos pelos desertos até encontrar
Sopro, irmão mais novo de Brisa, filho da Vida e que há tempos reclamava a
muitos daquelas áreas secas que desejava melhorar de função. Sopro era ajudante
geral da Natureza e sua função era movimentar, balançar e agitar coisa ou outra
esteja presente no fogo, na terra, na água ou no ar. Malandramente, Trevas fala tudo o que Sopro
desejava ouvir e, como a nova função de nada atrapalharia seus serviços atuais,
tratou logo de travar acordo com Trevas.
Um dia, enquanto Homem se deleitava com o presente
dado por Luz e Deus, Trevas aparece em um sonho, vestido de reflexo, envolvendo
o Homem com a sua própria imagem. Foi quando lhe confiou à palavra contando que
receberia um segundo presente, desta vez, bem mais interessante e escolhido direto
por Deus, único e poderoso que só Ele. O homem, curioso como sempre, pergunta
onde e quando se depararia com tamanha divindade. Trevas responde que tudo virá
como um sopro, manso e fresco.
Acordado e maravilhado, o Homem anseia tal momento.
O tempo passa e quando menos espera, um lindo embrulho aparece. O Homem se
apressa ao abri-lo e ao tentar levanta-lo, sente-o extremamente pesado e gélido.
Intrigado, se pergunta o porquê de tamanho peso num pacote tão pequeno. Coisas
de Deus, pensou ele. Delicadamente começa a desenrolar até que antes de desatar
o último laço, se depara com uma sensação de medo. Sopro, que a essas alturas
tudo observava e estava escondido, o atinge com um bocado de coragem, fazendo o
Homem seguir adiante.
Ao abrir, vê algo extremamente negro e nunca visto
antes, nem mesmo parecido. Por mais que tentasse tirar, não conseguia. Foi
quando Sopro se apresenta e pergunta se deseja sua ajuda. Lembrando-se do sonho
que tivera certa vez, aceita. Sopro assopra o negro funesto no Homem, o que o
mata instantaneamente. O plano com perfeição foi efetuado. Homem morreu antes
da chegada do Tempo, satisfazendo os caprichos de Trevas.
Deus, chegando de mais um dia de criação, descobre a
façanha de Trevas e Sopro e, antes mesmo de pensar em puni-los por tamanha
inconsequência, convoca a presença imediata de Vida e seu filho Sopro, este ciente
de seus atos, fica apreensivo com o que poderia vir acontecer. Após ouvir
calmamente as queixas de Sopro sobre suas funções e sob o argumento de que o
sono e a morte andam junto, Deus o perdoa.
Deus leva o Homem para o alto da montanha mais alta e
o divide em duas partes. Com a ajuda de Luz, cria o espírito e o guarda na primeira
parte do Homem. Designa à Vida a responsabilidade em guiar o espírito do Homem
para a Eternidade. Já a segunda, recria o corpo mortal, agora um pouco mais forte
e com alguns defeitos, pois só assim poderá fortalecer-se ao buscar a Perfeição.
Deixa a cargo de Sopro direcionar o corpo mortal para as boas ações, sob a
condição de que não poderia interferir nas escolhas do Homem, nem contar sobre
o futuro, apenas adverti-lo sobre uma coisa ou outra. Em caso de dúvidas, tanto
Vida quanto Sopro poderia procurar os Anjos, pois estes respondem por Deus nos
dias que estiver fora para assuntos emergenciais.
Com Trevas, Deus teve uma séria conversa entre pai e
filho e clamou para que ele nunca mais fizesse o que fez. Mandou-o de volta
para a escuridão, que a essa altura, sem comando algum, já estava mais do que
um caos. Confiou-lhe o legado em continuar o trato com Sopro, mas de uma forma
diferente.
Documentado e autenticado pelos Anjos, a segunda
parte do Homem, ou seja, o corpo mortal, também seria de responsabilidade das
Trevas, a depender, é claro, dos atos do Homem ainda em existência e do
desempenho do Tempo, seu irmão mais velho que diferente de Trevas, era comprometido
e dedicado com as coisas da Criação. Caso não fosse de merecimento do Homem, Trevas
e Sopro de nada poderiam fazer. Ficaria feliz se soubesse como é, tanto com a
nova função, quanto com o nome que ganhou. A partir daquele momento, Trevas se
chamaria Morte.
Sacramentado perante Deus e os Anjos, os sócios
Sopro e Trevas registram o nome da nova sociedade: Sopro da Morte Sociedade
Anônima.